Panis et Nonsenses... !!!

Divagações, momentos, memórias, delongueadas, poulaineadas, patetices, cinismo, teses de sentido e validade duvidosos, jedaizices, incoerências ambíguas e sem lógica, e supercalifragilistiexpiralidosações em geral! Ou seja, eu... eu acho!!! Constante inconstância exclamativo-interrogativa... acho que isso diz muito e pouco, dependendo da ótica

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Não creio que esse perfil mereça algum esforço de boa descrição... Não que este daqui mereça, mas: http://www.orkut.com.br/Main#Profile.aspx?uid=995235312369024623

Sunday, February 14, 2010

Essa não é, nem de longe, a questão que mais vem me tocando no momento, porque a vida anda atribulada e cheia de emoções e medo. Mas, de algum modo obscuro, ela voltou à minha mente perturbada nesse aprazivel finds/feriado, e em um outro impulso inusitado resolvi retomar esse blog com ela.

Me veio na cabeça a alegria que é assistir um homem sábio e grande em sua área reconhecer alguém tido como menor e esquecido, se mostrar grato ou mesmo humilde admirador dessa figura como a qual os admiradores do grande homem pouco se importam ou mesmo ignoram.
O caso que me trouxe isso é o que vemos no documentário do João Moreira Salles (vou evitar de ficar puxando o saco do filme nesse momento, mas simplesmente acho o máximo!) sobre o pianista Nelson Freire, nosso mineiro quietinho que é referência mundial em interpretações de Rachmaninoff, Gluck, Beethoven e toda essa gente pouco bronzeada que tem tanto valor.

Há um bloco do filme onde o Nerso compartilha conosco, na Tv de sua sala, um vídeo do Erroll Garner tocando doidamente. Garner foi um pianista americano de jazz que tocava um swing muito original maravilhosamente, com uma energia de dar inveja a sambista carioca.
http://www.youtube.com/watch?v=5VhKbE_pf_E&feature=related

Nelson declara sua branda inveja, por não se sentir capaz de improvisar, de tocar com aquela energia, com aquele swing, não consegue comparar sua vida dedicada ao piano àquela VHS onde o o bigodinho malandro do Erroll passeava pelo piano como quem acaba de ter certeza de que a vida é bela e é dos malandros merrmo.
É aquela inveja com brilho nos olhos e sorriso de boca aberta exclamativa, a inveja de fã, que sonha em poder apertar aquelas mãos negras e dizer que queria ter um pouco daquilo por meia hora.

Talvez os puristas mais estritos da música erudita, que não respeitam a música popular e o jazz, queimados em paça pública sejam, não o perdoem. Não acham digno do Nelson, o impassível, o concentrado, os dedos que trazem à vida aqueles monstros imortais reverenciados, se encantar com esse respiro que é o jazz, que é a expressão popular em um momento de plena e reverenciável sofisticação técnica e artistica.
Eu simplesmente acho muito bonito, muito bonito. Um homem com tanta propriedade ver beleza além de sua criação e do seu clube, ser fã de um parente de sangue menos azul e invejar as qualidades que só ele consegue ter.

Isso me lembra uma outra história, contada por um primo de meu pai sobre um amigo dele. Esse sujeito, não sei campo nem nome, é um acadêmico brasileiro mundialmente respeitado. Parece que ele ganha uma boa bolada, todo ano, para dar a aula inaugural e mais algumas palestras em uma universidade norte-americana (ou será que adoto o termo justo, "estadosunidense", à moda Wiki?), uma sueca, e me parece que outra britânica. Portanto, um homem respeitabilíssimo, um erudito. Sabe qual a coisa que mais dá prazer a esse homem na vida, o relaxamento mental dele? Depois dessa maratona cerebral anual muito bem paga, se enfiar na rocinha dele lá no interior de MG, e ficar ouvindo causos dos matutos locais, tomando uma pinguinha enquanto contam histórias daquelas bandas. Eu posso imaginar isso!
A questão não é o fugere urbem (não sei se tenho essa ilusão, e olha que eu sou um caipira ainda meio saudoso em Sampa!), nem a pinga; é o saber reconhecer que se é mais completo, pleno e mais próximo a um sentimento de satisfação com essa vida quando se pode chegar a um extremo de descoberta, voltar ao outro pólo cru e simples, e entender que eles não se anulam, que na realidade é a mesma coisa e ambos necessitam do outro. É ver que, quanto mais se conhece, mais se tem a noção de que já estava tudo lá no começo, em um nível mais simplificado e invisível aos olhos.

Pode ser uma bobagem imensa minha, aliás, há grandes chances de ser. Qualquer um dos dois tópicos, e mesmo a relação entre eles que eu fiz. Mas sinto e creio nisso verdadeiramente, e sempre me comove ver algo do gênero.


Droga, queria rever meu DVD do Nelson Freire, não encosto nele faz meses, mas não acho! Deve ter ficado em Sampa... Ainda bem que tem Youtube nessa vida.
http://www.youtube.com/watch?v=d8ps8ejs52k


{Como sempre, mantendo meu desleixo, ou automatismo, postado de primeira leitura, sem direito a revisões e releituras de estilo. Espero que o texto não esteja muito porco ou pouco estruturado, desculpem.}

Saturday, September 12, 2009

"Alguma coisa acontece... quando eu cruzo pra Paulista, da Consolação"

As vezes eu me esqueço o quanto a Avenida Paulista é surrealmente bonita, e única. Agora nossa relação vai muito bem mas, nos tempos que detestava Sampa, sempre usei a lembrança ou a presença da Paulista para tentar gostar mais da cidade; como quando você briga ou está com raiva de alguém, e tenta ficar lembrando dos momentos saborosos do convívio, em que toda a chatice e incompreensão pareciam nunca ter existido ("... no tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido", sempre me vem o João&Maria), em que compartilhar era uma delícia e tudo na vida parecia valer a pena, incondicionalmente.

Um Cep da lista da Ect, uns 3Km de prédios acortinando a paisagem que só o vão do museu não comeu, um amontoado de surpresas em cada alameda que escorre daqueles semáforos multifaixa malucos, que na verdade também são a Paulista (vai dizer que a alta Augusta, do Cinesesc e do Unibanco, não são também Paulista?). Caminhadas, grandes filmes vistos, um pouco de filme feito e discutido, um argumento de longa, grandes amigos, teatros, a melhor livraria com dragão de madeira num perímetro de 10000Km, corridas dignas de Louvre godardiano, uma igreja meio intrigante, tentativa de militância estudantil, jantares, vívido amor vivido depois fraco amor quebrado, o primeiro Van Gogh, idéias de metrô, deslumbres e tristezas. O marketing-cartão de "coração da América do Sul" soa muito cafona, mas é sentido e engrandece ainda mais. Foi ai que eu aprendi o que era São Paulo, e que eu aprendi a gostar disso, e a me ver anônimo e contente como mais um deles, ou mais um dos caipiras (pero ainda e sempre orgulhoso disso) que se tornava um deles. Não tanto quanto a emoção (provavelmente falsa e ilusória, infelizmente, devo adimitir) romana de "você, de fora, está e é daqui, seja a gente", esse acolhimento fraterno, mas é uma coisa de caipira que eu gosto de sentir, e paradoxalmente, dentro dessa magnitude paulistana de impessoalidade diversa, tenho alguns sabores disso dentro dela, o convite e a acomodação.

Ela pulse e é plenamente a Paulista no dia, no meio da semana, com um maldito sol trincado, mas de preferência um vento que flana pelo seu corredor e faz o vão do Masp parecer um local sagrado cheio de energias e vibrações. Ainda que eu saiba disso, é na alta noite-madrugada, com o vazio relativo de um lugar que não fica um nanosegundo sem gente tem mais de um século, que eu tenho mais prazer em senti-la. Porque estática, porque despojada do que mais se pode associar a ela, sem nenhum canto para entrar, ela ainda consegue ser tudo isso, porque ela é um cristal indesmanchavel, um ente hibernante. O tipo de coisa que, se um meteoro atingir a Terra, a gente torce pra que saia voando em um sólido bloco único, "junto aos restos de catedrais e a tampa da minha Parker 51 prateada que eu nunca mais achei", diria o Verissimo.

A revi desse jeito anteontem, ou melhor, ontem. Uma conversa breve de outros assuntos mais agudos, e o magnetismo do lugar atraindo a atenção para si, alegrando. Uma despedida breve e, novamente solitário, a volta rápida pela avenida: para além dos tapumes, vazia em um escuro quase claro, azul sincero, profundo e denso, entendeu o quanto gosto dela, e me disse "esteja sempre".

Saturday, September 05, 2009

Aria n°2 - esboço de meia hora

Um primeiro dia (pouco) mais calmo em dias. Acordar não tão cedo e me propor a ver um pouco de filme antes de ir pra reunião (e são tantas, e são tantas, o que houve com a vida?) na Eca. Aliás, acabei o filme só depois, é da minha lista pra pesquisa de TCC: "Maradona by Kusturica": claro que o argentino é um imenso ególatra mas, putaquipariu, não lembrava que ele chutou tão bem, mammamia; e olha que futebol não costuma me comover quase nada.
Pra ir à reunião, a eterna espera pelo maldito 7725/10 da Sptrans, uma linha de ônibus dadaísta que nãoo gosta de manter padrões entre seus horários largamente espaçados. Em Sampa eu não sou um ser motorizado, e isso tem me frustrado no limite, quero resolver isso bem em breve... enfim, enfim.

Chega a moça-de-vestido-verde-botas-gnomo-celular-vermelho-com-ligações-tensas, pergunta pelo mesmo ônibus. Troca de comentário descontente semi-sorridente comme d'habitude, ela senta pra resmungar no celular, eu continuo com a mente rasa e esvaziada, procurando alguém mais notável para observar, pensando em segundo plano em uma tira em quadrinhos para se desenhar...
Eu já conhecia a outra menina que chega de vista, do ônibus de volta ou da região do condomínio. E, se sou um péssimo fisionomista e não botaria fé em saber de seu rosto e jeitos, guardo com facilidade elementos como uma mochila mínima bordada do "Festival de Inverno de Campos do Jordão"; adoraria ir no próximo, preciso criar vergonha e dar um jeito. Por mais que eu não goste daquela cidade, más lembranças.
Ela me faz a mesma pergunta da outra moça, desculpeeutambémsóchegueifaz5minutospoisé, agradece e se senta. Na meia-hora seguinte, a pobre moça atrasada me foi um excelente assunto...
Se a mochila era uma boa dica, sua abertura e o maço de partituras tirado pela mão pálida confirmavam a Ecanidade, e o Departamento de Música. Pronto, uma instumentista, ou talvez compositora, regente!
Tentei ler a partitura com minha competência musical limitada e destreinada, uma aria bem clara, pareceu simpática. Folhas com algumas notas a lápis, e uma leitura atenta pelos óculos ovaloides metálicos, lembrando bastante os do Iuri. Olhos cor de azeitona de pote de mercado concentradíssimos, dedos torcendo com uma leveza que ocultava a tensão que não calava.
Os cabelos castanho claros, perdendo na altura dos ombros seu liso confuso em um embrenhado de quem dormiu mais do que podia, começou a se retorcer como vento leve, impossível se notar no cenário do caos, junto ao pescoço e dedos que dedilhavam a própria folha de notas. Um piano de uma oitava sobre o saco plástico.
E me assombrei. Menos de 2 metros e meio dali, passavam ônibus Lapa com cem pessoas dentro, caminhões pesados de tremer a tampa do bueiro, carros de escapamento estourado, pessoas apressadas com seus Mp3 players sem fone (a maior grosseria da pós-modernidade, individual forçadamente compartilhado... faz um Facebook e entra prum BBB da vida, meu caro, não me estorve a paciência matinal!). Centimetros com tudo isso, e o dedilhar era tão harmônico, tão independente, senhor de si, inerte e autosuficiente no meio da guerra nuclear. Uma sala de estar interna. As batidas dos eixos de caminhões começaram a fazer sentido, as teclas me davam aquele som em compasso, vi a música, ouvi a partitura! Sem pedir licença pra menina, entrei naquela bolha, fez sentido, fazia sentido!

Os dedos recolhem o saquinho de partituras e colocam de volta na mochila serrana, medo de entrar no transe e não ver o maldito 7725/10. E quem sou eu pra pensar "eu te aviso quando, pode deixar, continua"?, afinal, também roubei pra mim o transe dela.
Os dedos continuaram se torcendo, aquela tensão contida. Eu sei que é, eu também disfarço fazendo isso, energia saindo pelas extremidades.

O ônibus passou, ela entrou com sua mínima pinta na bochecha e expressão de menina estudiosa, eu também. Tamborilei melodias o dia todo, mesmo e principalmente a dos caminhões da rua. Na falta de um piano, não...?

{
Só completando: ao chegar na Eca me apresentam isso, fascinante, partitura visual material... e só agora, escrevendo (! - "das funções da escrita, capitulo 2: a ordem pessoal e auto-conhecimento") , me cai a ficha da sincronicidade! Tem tudo a ver com o que passei, ainda que brevemente, minutos antes!!!
http://www.youtube.com/watch?v=Ws_R_GxZX2o

http://www.youtube.com/watch?v=GF0-wGbRqEs

Mágico, vida mágica!
}

Hora de dormir, cansaço acumulado é mesmo veneno de workaholic... Foi a sensação desse minuto que ficou de hoje, foi bonito pra mim.
Boa noite!

Monday, August 17, 2009

Gustavo e. s.

Costumo ter a petulância de achar que lembro de quase tudo da minha infância, ou quase tudo que foi relevante. Tipo o adesivo do Fleury Governador (como?!) que eu colei no meu pequeno Monza a pedal, ou os roteiros e falas da maioria dos desenhos do Pica Pau, ou a formação habitual de ataque dos cowboys contra os índios do mal no Forte Apache (eu não sei se eu já via western pra sempre matar os índios, devo ter tido essa idéia vendo a caixa do brinquedo), ou o adesivo Mickey&Minnie Mouse no vidro do Fiat Prêmio dourado da minha mãe. Mas quase.
Em Itatiba, há algo curioso e saudável, que vem numa época interessante da vida dos teens ou pré-teens, o Encontro de Jovens. A molecadinha de maomeno 13 anos, católica ou pseudocatólica ou querendo dar uma passeada com os amigos (creio que eu estava nos primeiros, e acho que ainda estou), passa uns dias em uma casa de retiro pensando sobre a vida, o universo, e todo o resto (42); sob viés religioso, obviamente.
O que nos interessa nesse caso é que, no último dia, antes de rever a família, todos recebem “no confinamento do BBB” cartas dos amigos e familiares, um pacotinho com um monte de mensagens. Me lembro de algo das minhas, estão em um baú, desses dias não passa minha visita ao fundo dele. Mas, vamos ao caso, essa história vem das de minha prima, que fez encontro quando eu tinha quase 7 anos, e recebeu uma sulfite deste que escreve.
Essa semana, retomou seu velho pacote e ontem me falou da minha carta. Tinha desenhos, é de se esperar, entre eles um grande navio. Nunca entendi de onde veio minha obsessão de infância por navios, que levou meus pais a comprarem lá em Ubatuba um daqueles de madeira e corda, uma respeitosa réplica artesanal de caravela que eu nem conseguia abraçar na época, e que fica até hoje no meu quarto. Não que eu não ligue para os navios hoje, pelo contrário, mas sem grandes paixões. Minha prima ainda diz que eu tinha uma frase começada, e recomeçada, a primeira sílaba solta no início e um recomeço da palavra com uma letra mais caprichada; não é de hoje que minha caligrafia é duvidosa.
Não me lembro de nada disso, nem acho que deveria, mas fui construindo a imagem de uma das minhas primeiras “cartas” na cabeça, eu que depois fui gostar tanto de escrever cartas e e-mails grandes. Mas o que mais me intriga agora a rever esse papel é a assinatura: “Gustavo e.s.”!
A Juliana me questionou sobre o que bozenas seria esse “e.s.”, e me frustro ao afirmar que não faço a mínima idéia!!! Essa assinatura aparece duas vezes na carta ainda, e não tenho uma só gota na Penseira (momento HP fora de tempo, hora e contexto, ok) que diga algo dessa abreviação. Desde que me lembro como gente, ou como esse similar, sou só o Gustavo F., e ponto.
“Gustavo e senhora?”, eu não era casado nem namorava! “Gustavo envia o Senhor”, eu tava numa vibe de profeta juvenil, tipo a Menina Pastora do Youtube, medomedomedo? “Gustavo está sacaneando”, com efeito retardatário de 15 anos, dado que eu estou com raiva por não lembrar? “Gustavo exaspera sentidos”, um momento pré-semiótico, dadá, de vaidade gratuita? “Gustavo enviou Sedex”, já que era uma cartinha (existia Sedex em 1994?)?
Gustavo evita saber.
Até gostaria, mas acho que não tem mais como...

Thursday, July 30, 2009

Ônibus na terça, pouco antes das 18h30. Menos lotado do que a companhia que queima diesel desejaria, pouco mais lotado do que considero suficientemente confortável. Um dedo cansado, mas feliz por ir ao teatro após muito tempo; mal sabia que os ingressos estavam esgotados desde o dia anterior, com uma lista de espera frente e verso. Paciência, deixa pra outra, mas fico surpreso.
Enquanto boiava e me debatia incessante nas minhas trivialidades de sempre, quieto no meu banco, começo a reparar na conversa da moça no banco de trás. Ao que parece, usava um certo sistema no escritório, e trocaram-no contra seu gosto; agora, desejavam dela funções que, já havia avisado, não poderia cumprir no novo sistema, e nesse samba da incompreensão ameaçaram a coitada até com demissão. Bem, isso não tem a mínima importância para esse post: me importa a voz dela!
Não havia visto seu rosto, não fazia idéia de quem estava logo atrás de mim, tão inconformada e instável. A voz me lembrava alguém, pero quemquemquem... quem? Depois de alguns metros de Avenida Rebouças, cinquina e bingo, a tia Cleide! A Cleide me deu aula no pré-primário lá no começo dos anos 90, fechou a minha alfabetização, e me acompanhou no palco quando eu fui o pequeno orador da turma na formatura, lendo aos trancos o discurso escrito em uma sulfite séria para a platéia distraida.
Foi gostosa a lembrança, um saborzinho saudoso gostoso de receber no fim de uma tarde escura de vento. Continuei ouvindo um pouco da desgraça profissional da mulher, achando que aquela voz não era a de quem se exalta frequentemente como ali, vendo a Cleide mais jovem ali pertinho.
Chega minha parada, Paulista, e ao me virar vejo uma mulher com um rosto que deve se parecer muito com o que foi a Cleide jovem!!!

Há tipos físicos bem próprios que vemos perdidos pelo mundo, em lugares e condições bem distintos, que juraríamos ser irmãos ou primos. Pacotes de cabelo, formato de nariz, bochechas, olhar, curva do pescoço, tipo de pele, grossura da boca... como se fossem "raças" de homens, como nos cães. Formas próprias, famílias de seres destacados de um núcleo filiadas à mesma escola de design ou studio, padrões que a ciência ainda não agrupou. Sei de especialistasque podem dizer, por exemplo, de que região da Itália é a família do neto de imigrante, só pelas indicações da face, muito intrigante.
Essa menina tinha o mesmo nariz de tendência equina (que elas nunca me leiam!), as bochechas ósseas delgadas na vertical, o cabelo escorrido cor de noz, os olhos pouco abertos em formato de amêndoa levemente inclinados para os lados, a pele de tendência inconstante nas maçãs de rosto, os dedos longos. Notei tudo isso no flash em que pude olhar para ela, ou vi algum ponto mais destacado e construo o resto em minha cabeça, difícil discernir. Provável que, dada a vontade de rever a Cleide, ou sendo mais honesto, a vontade de ter 6 anos e passar a tarde com a mão no guache com um chapéu na cabeça, eu tenha construído quase tudo através da voz.
O desejo foi de que a Cleide envelhecesse um pouco, descesse na Paulista e fosse na Livraria Cultura, terminar de me ensinar a ler enquanto eu acabava "A árvore dos desejos", do Faulkner, sentado nos puffs sob o dragão de madeira do teto.

Tuesday, July 21, 2009

Mudanças (não as da Graneiro)

Um certo tipo de elemento tem me feito ficar bem feliz comigo mesmo: tenho me sentido mais flexível pra vida. Em surtos momentâneos, tenho cogitado e pensado em novos rumos, comendo coisas diferentes (os próximos sabem que mantenho algumas restrições alimentares relativamente imbecis), arriscando mais, me permitindo, pensado mais livremente... Não acho que mudei, nem fiquei menos confiante ou apegado ao que sou (que, pateta, um tanto travado e nem sempre razoável, sempre gostei de mim mesmo), mas as minhas liberdades de ir além da auto-contestação e colocar pontos em prova parecem melhores. A maior parte das coisas nunca vai mudar, não tenho dúvida, e nem tenho a mínima gota de vontade de que mudem - não tenho a mínima pretensão de comer feijões, de deixar de ser heterossexual, de me tornar ateu (apesar das crises de fé, normais, dado que é uma fé) -, mas temos que evoluir em alguns pontos, fico feliz me vendo em evolução (quase um Pokémon...).

A criança que não tinha a mínima vontade de ir ao Hopi Hari, hoje adora avião, prédios altos, desafios físicos e tá doente para pular de paraquedas e asa delta. O que fazia piada com a falta de dedo e formação do Lula continua contestando a droga da política (mal necessário) caótica, mas reconhece que distribuir dinheiro para quem notoriamente precisa bastante é um caminho de socialização factível, algo além de assistencialismo populista a la coroné, e até se comove com isso.

Acho que tudo isso pode ter a ver com o fato de que os rumos e planos que faço para minha vida em um futuro breve, com esse novo ritual de passagem do final da faculdade (já dissolvido como os outros pelos quais passei, pero ainda necessário e importante para esse pobre ser amigo dos simbolismos e marcos), do estágio, e do comodismo gigantesco dos rumos e tarefas pré-indicados e direcionados... Mais precisamente, de que esses planos, ou não-planos, ou planos incertos que me amedrontam e não sei até que ponto posso contar, podem não dar certo e posso cair no vazio.
Se a falta de chão é tudo que me assombra, devo reconhecer que a possibilidade dessa lástima pode ter a ver com meus avanços. Embora em parte do tempo eu continue perdido, ou cada vez mais perdido, amedrontado como um garoto de cabelo-tigela em seu Velotrol no quintal da vó (preciso parar de repassar na cabeça os álbuns de família!), os momentos de esperança iluminados por refletores inesperados e com brilhos e filtros novos (essa de estudar fotografia, que me faz...) devem ter a ver com isso. E devo ser grato e vibrante por isso, afinal.
Há semanas, me deu o surto de que, vai que acontece, pode ser legal sumir pra longe e me desligar por um tempo de tudo. Fazer algum trabalho legal com alguém e por alguém, descobrir se boa vontade e alguma (não) habilidade minha pode ser mais útil do que tem sido. Sabe, eu admiro do fundo da alma aquela gente que larga tudo e se enfia em algum país africano pouco citado pra pesar criança e distribuir remédios e orientações. Eu não sei se eu tenho estrutura, de personalidade, física, e emocional, para ser um desses, mas tem me dado uma coceira interior de que ia ser o tipo de mudança que faz uma vida valer a pena. Radical a ponto de, provavelmente, pedir arrego ou dar um tiro na cabeça em pouquíssimo tempo, mas ainda assim válida em algo.
Não é apenas ajudar os outros, apesar disso ser maravilhoso, e notável que é o que mais falta na nossa maldita raça (junto à disposição para entender e compartilhar).
Como toda ação humana, egoísta ou agapicamente (um jeito bonito de ver o sistema todo, gosto dele, consolador), de certo modo os maiores beneficiados somos sempre nós mesmos... Bene, vamos pensar que é pela humanidade então, a vergonha alheia de nós mesmos fica um pouco menor. Agapicamente, vamos nos orgulhar então.

Obs.: Continuo me dando ao luxo injusto de postar sem revisar, preguiça boba. Muitos erros? Desculpe, lamento. Só um pouco, mas lamento.

Sunday, July 19, 2009

Guinness (não a cerveja...)
A banca de promoções, pilhas mal ajambradas de edições pequenas e cheias de orelhas. Dá pena a falta de cuidado da livraria com esses livros "menos significantes", que já podem sair por trocados, não interessam mais...
Guias de viagem para países como Mali e Ilhas Fiji, manuais de programação em linguagens inacessíveis e tediosas, auto-ajuda baratos (semi pleonasmo aqui) de desconhecidos, e alguns livros infantis mal impressos e de índole didática duvidosa.
Ainda assim, como amigo dos livros e sovina muito atraído por promoções, tenho que parar e checar. Me atrai uma versão pocket, em papel jornal (Mad Magazine), do World Guinness Book of Records 2008, por míseros R$5,90.
O Guiness Book, versão grande, de 1995, é um dos livros que mais me divertiram na infância. Tinha idéias grandiosas, inemagináveis, debilmente divertidas e improváveis, que me traziam aquele gosto de mundo grande, infinito, com tanta gente diversa e bizarra a se topar, com gosto de aventura e de exoticidade.
Revisitar algo do tipo, além do prazer per se do livro, me carrega de volta essa xeretice de criança que persiste, que nasceu com O Guia dos Curiosos, acredito. É um gosto bom, me apetece degustar com calma...
Vou à fila do caixa, que nunca é muito grande na Fnac D.Pedro, e a moça do caixa me chama. Simpática, passa o livro no "bip" e abre a boca.
- Ah, eu quero um, que barato, olha isso!
- Tem mais uns dois, lá, corre e pega que vale a pena! Se for ruim, o prejuízo é pouco, né?!
- Mas eu não posso sair daqui!
- Tem alguém da loja que pode ir lá e te reservar?
- Não...
- Eu vou lá e pego pra você então. Você quer?
Ela fez uma expressão bastante surpresa.
- Eu seguro o seu aqui então...
Rapidinho, me enfio na loja e volto com o outro, com um pouco mais de orelhas e marcas que o meu. A gente pode se dar ao luxo de escolher, nessas bancas, as vezes!
Ela espichou a cabeça sobre o balcão e me acenou para passar na frente do outro cara na fila.
- Ah, obrigada, obrigada!
- Magina!
- Você lê em inglês, é?
- Tô meio destreinado esses tempos, mas entendo sim. E você?
- Ah, leio sim.
Ela tinha óculos de acrilico arestados, de universitária de humanas, claro que ela lia em inglês. Não me contive, o que me surpreendeu, e tive que jogar a próxima.
- É que agora eu tô estudando francês.
- É?! Eu também! É bonito, né?
- Nossa, muito. Meio difícil, mas com calma...
- Ah, é, a gente vai lendo...
O cara na fila já esperava havia um tempo, notei nesse momento. Ela olhou de baixo, como quem agradece aquela conversinha breve pra variar, em meio a clientes mudos que sacam com destreza o Visa.
Olhei pra ela, um olhar seria-divetido-conversar-mais-depois-quehorasvocêlargaaquiparatomarumcapuccino(porque eu não sou muito de café puro, entende?)- -,- - ,masmeuspais-estãonalojaaolado-tenhoquevoltarpraminhacidade.
Peguei minha sacola e o recibo fiscal. Ponto.
O pocket é menos interessante que o colorido grandão da minha infância, naturalmente. Mas tem suas bizarrices divertidas, que me entretem do mesmo modo, em folheadas rasas.
Espero muito que ela esteja se divertindo também...
P.S.: o maldito blogger não está pulando as linhas, meu texto fica tudo grudado; isso estraga a leitura, isso me irrita!